21.7.09

Piquet Carneiro: 'modelo político brasileiro facilita corrupção'

Entrevista concedida ao GLOBO.

















BRASÍLIA - No Congresso, mais da metade dos parlamentares não tem ética. A avaliação é do advogado João Geraldo Piquet Carneiro, que em 2000 ajudou a elaborar a Comissão de Ética Pública para fiscalizar a conduta do alto escalão do governo. Para ele, a culpa dos desvios é a mania do Executivo de distribuir cargos em troca de apoio político. A solução seria aumentar a fiscalização no poder público. ( Relembre os escândalos no Congresso )

O GLOBO: Como o senhor analisa o comportamento ético dos parlamentares?

JOÃO GERALDO PIQUET CARNEIRO: A ausência de padrão de conduta ética pega mais da metade do Congresso. Mas nem tudo é corrupção. Os abusos com passagens, por exemplo, são desvios de conduta.

O GLOBO: O senhor acha que é possível coibir essas práticas no poder público?

" O Executivo tem de distribuir cargos para manter a coalizão, e esse preço é altíssimo "

PIQUET CARNEIRO: A situação é complexa, porque o modelo político brasileiro facilita a corrupção. O Executivo tem de distribuir cargos para manter a coalizão, e esse preço é altíssimo: são as emendas ao Orçamento, as nomeações para os ministérios. Isso é um problema, afeta os padrões de conduta. Claro que os partidos estão interessados nos órgãos que têm mais dinheiro. Os Correios, por exemplo, têm muito dinheiro disponível e, ao mesmo tempo, nenhum sistema de fiscalização interna. Por isso deu aquela confusão denunciada pelo (ex-deputado) Roberto Jefferson.

O GLOBO: Isso acontece em outros órgãos do governo?

PIQUET CARNEIRO: A Comissão de Ética Pública encomendou um estudo em 2003 para identificar órgãos e empresas públicas mais suscetíveis à corrupção. Foram analisados vários fatores, como a quantidade de dinheiro disponível no órgão e os mecanismos internos de fiscalização. Concluímos que a Empresa de Correios e Telégrafos (ECT) é a mais suscetível à corrupção.

O GLOBO: Ficou mais fácil desviar dinheiro público?

PIQUET CARNEIRO: Até uns anos atrás, os ministérios que hoje estão endinheirados não tinham dinheiro nenhum. Com a estabilização da moeda e com o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), que valorizou ministérios da área de infra-estrutura, os órgãos estão cheios de dinheiro, mas sem nenhum mecanismo de controle.

" Órgãos usados para barganha política precisam ter as licitações vigiadas por gente de fora. Não extirpa o mal, mas dá uma chance de conviver com ele "

O GLOBO: Como esse controle poderia ser feito?

PIQUET CARNEIRO: Órgãos usados para barganha política precisam ter as licitações vigiadas por gente de fora, como o Ministério Público. Isso não extirpa o mal, mas pelo menos dá uma chance de conviver com ele.

O GLOBO: E o Congresso, não carece de fiscalização?

PIQUET CARNEIRO: O desgaste chegou a tal ponto que não me surge nenhuma ideia nova. O Conselho de Ética da Câmara não só absolveu o deputado Edmar Moreira, aquele do castelo, como não deu a ele nenhuma outra punição. Ele está levando uma vida normal.

O GLOBO: A Comissão de Ética Pública, do governo, tem cumprido sua função de fiscalizar a conduta dos altos funcionários do Executivo?

PIQUET CARNEIRO: Houve um grande enfraquecimento da comissão, que ficou funcionando por mais de um ano com apenas quatro dos sete integrantes. A comissão foi muito pouco prestigiada nesses últimos quatro anos, e isso pode ser ruim para a imagem do governo

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