17.7.10

Mais dois capitulos de Vanda. Uma micro-novela de Arildo Guimarães.






Aqui está mais dois capítulos da fantástica historia de Vanda, micro-novela escrita por Arildo Guimarães. “Repostamos” os dois capítulos anteriores para os que vão ler pela primeira vez essa grande história. Quem já leu, basta pular os capítulos em cor laranja e ir direto aos em negrito. Boa leitura.










A HISTÓRIA DE VANDA

Dedicado a Miguel

Pesquisando nos dicionários eu não encontrei a palavra muso. Bom, nem o Word a reconheceu. Mas eu não seria justo se não dissesse que eu tenho uma inspiração ou um ser inspirador, mas ele não é uma deidade, ele é um muso inspirador. Se eu voltei a escrever qualquer coisa foi graças a ele e nada mais justo que dizer isso aqui.
Graças a você Miguel eu recuperei a vontade de escrever e tudo que eu escrever terá sempre um pouquinho da tua alma portenha presente. Então é isso. Obrigado pelo apoio constante de todos os dias e pela inspiração de sempre.

O autor.



CAP I: O QUARTO
Sentada sobre a cama a mulher olhava fixamente a janela e o dia de sol lá fora. Por entre a sua visão e a imensidão do mundo uma bela grade de proteção se estendia pela janela. Aquilo era um sinal de proteção, que deveria impedir aos que viessem de fora invadir o pequeno mundo de Vanda. Mas a mulher alisava a sua bela gata, que se espreguiçava sobre a cama e amolava suas unhas sobre a colcha branca, onde, aliás, era tudo branco naquele espaço. A gata agora olhava também a janela e vigiava com seus olhos felinos uma enorme borboleta que passeava contra a luz do sol e num repente ela pulou sobre a pequena Vanda, deu um salto sobre a cama até a janela e passou entre os ferros da grade e ganhou a liberdade do mundo, onde uma borboleta azul fazia peripécias acrobáticas no ar e a gata branca tentava a todo custo pegá-la.
Vanda ainda sentada sobre a cama sentiu-se mal, como se todo o branco do quarto avançasse sobre ela e o espaço que antes era um refúgio tranqüilo parecesse uma prisão inócua e sem vida. Mas seus olhos se fixaram na janela e a mulher como a gata deixou que a sua visão ultrapassasse as grades fortes de ferro e tomasse o mundo lá fora.
Como uma borboleta grandes asas de mariposas simplesmente nasceram no corpo esguio da mulher, impedindo que ela caísse sobre a cabeça de mil transeuntes que não estavam ali, aliás, lá fora não era o quarto de Vanda. Ela se assustou, mas as asas agora a levariam a qualquer lugar. O mundo lá fora não era mais o mesmo que a mulher um dia sonhou desbravar, tudo tinha um colorido azul, ora mudava para o verde, o vermelho. Era um mundo de cores e ela simplesmente voava com asas que não eram suas, mas que a levaram até uma enorme fila.
Vanda entrou na fila, lá na frente um grande cavalo sentado num belo trono de alfafa recebia oferendas de todos os tipos e lugares do mundo, muitos estavam ali para beijar os seus lindos cascos fendados. Ela olhou em volta e viu que ali tudo era de ouro, do chão ao teto, tudo era ouro polido e brilhante, mas aquele ouro lamentava algo. Velhas histórias de sofrimento e dor. Não era um ouro puro, era o ouro das almas perturbadas e dilaceradas a muito em um mundo que Vanda desconhecia. Despertando novamente a sua consciência, Vanda olhou em sua mão e lá estava um papel com o número 665, que marcava o seu lugar na fila para o Grande Cavalo. Ela sentiu que o dono do número 666, sussurrava algo em seu olvido, algo sobre liberdade e revolta e prazer. Logo sentiu que uma língua grande e escorregadia entrava por baixo do seu vestido e penetrava em sua vagina. A mulher teve um êxtase e desmaiou naquele mundo onde tudo que era para ser, só seria depois do fim do mundo.



CAP II.
OS FILHOS DE VANDA
Sentado na lua um insone observava a terra que lá de longe parecia um lugar calmo e tranqüilo. Mas nada era tranqüilo para Vanda, sua barriga crescera tanto que ali deveria ter pelo menos umas seis milhares de crianças, aquelas que foram mortas no massacre impetrado por Herodes o Grande, num tempo esquecido e que ninguém mais se lembra.
Vanda sentia-se muito mal, a hora estava chegando e ela caminhou até uma praia, ali seria o lugar onde ela iria dar a luz. Mas o barulho da música que vinha por todos os lados a atormentava, um milhão de pessoas dançavam freneticamente uma música que se repetia durante mil anos e ao fim do festim aquelas pessoas num transe frenético começaram a brigar uma luta que durou toda a estação das chuvas e no final jazia sobre a areia de Copabana um milhão de corpos que forram varridos e escondidos sobre a bela estátua do cristo redentor, que de braços abertos prometia abraçar toda a cidade.
Vanda caminhou até a água, mas aquela água do mar estava suja, um milhão de sapos e pererecas nadavam naquelas águas, mas a criaturas mais perigosas eram as bocas difamadoras que ali estavam perdidas há alguns séculos a espalhar mentiras sobre todas as coisas conhecidas. Aquelas bocas tinham a forma de um peixe, mas poderiam ser cobras no virar da noite e durante a manhã se transformavam em papel cheio de hieróglifos que recolhidas pelo governo eram vendidas como jornais, que depois de lidas e espalhar suas vulgaridades e obscenidades novamente eram descartadas e vinham dar na praia, onde se transformavam em bocas difamadoras.
Era chegada a hora, a mulher iria parir logo, e não havia um lugar sobre a terra que pudesse acolher aquela que daria luz as criaturas mais importantes já vistas nesse planeta que era observado pelo insone, que agora não mais na lua estava sobre o sol.
Depois de muita dor, e de gritar sem que ninguém viesse a ajudar a mulher deu a luz a sete seres. O primeiro foi o ponto, depois a vírgula, depois ao dois pontos, após a exclamação, o ponto e vírgula veio a seguir, um pouco depois nasceu à bela reticências e mais um pouco veio a nascer à interrogação.
Ali naquele lugar abandonado aquelas criaturas observam a sua mãe, uma mulher pequena e miúda que nunca antes saíra do seu quarto e agora era mãe de sete filhos incríveis. Cada um deles cresceu rápido e forte, mas o mais importante dele a interrogação era assediada por todos os povos do mundo pelo caos que ele poderia criar. Alguns achavam que aquela criança deveria ser queimada logo, outros tinham muito medo do que ela poderia trazer ao mundo, principalmente os demônios de vermelho. Deixar aquela criatura a solta seria um grande perigo, pois ela poderia despertar no homem a dúvida, e o homem nunca deveria duvidar daquilo que a TV. Dizia daquilo que o Grande Cavalo ordenava. Então Vanda vendo que ela e seu filhos corriam risco fugiram dali escondidos dentro de uma carroça de ciganos que estavam passando pela praia de Copacabana.

CAP 3
O MUNDO DE VANDA


Dentro da carroça dos ciganos havia vários compartimentos, cada qual reservado a um membro daquela estranha família que vinda do oriente distante trazia notícias do mundo lá fora. Um mundo grande e vasto, onde a mentira era agora a rainha e a verdade fora aprisionada pelos sete selos contidos no livro dos velhos patriarcas que outrora fundaram os pilares do mundo e conta-se até hoje em alguns grupos de estranhos seres humanos que também possuem um livro no qual eles dizem guardar todas as verdades do mundo desde o inicio, quando uma serpente com porte de rainha e ginga de passista de escola de samba fez o primeiro homem e a primeira mulher provarem do samba de raiz. E a experta serpente fez a mulher que era mais curiosa que criança em dia de natal experimentar a primeira caipirinha feita do limoeiro virgem do jardim das delícias. Conta esse povo que nesse dia foi solto no mundo a grande besta de sete chifres. O homem e a mulher como punição foram expulsos do Jardim das delícias, assim também tiveram seus olhos desvendados e puderam ver suas partes pudicas. Depois disso, eles já expulsos do Jardim das delícias e morando de aluguel em um descampado no meio de toda a bicharada copularam como dois animais e encheram a terra de todos os tipos de seres bípedes e com o polegar anterior.
Como toda história é contada pelo povo vencedor, a história dos ciganos só é conhecida por eles mesmos e nunca mais poderá ser contada aos outros humanos que não façam parte da mesma antiga estirpe, pelo risco que esses que escutem a história, tenham seus olhos desvendados e descubram que a terra não é quadrada e que os pilares do mundo é só uma forma de explicar as crianças que o planeta bola flutua no espaço e que os cientistas ciganos conseguiram através da sua magia determinar que a terra tenha mais de 4 bilhões de anos e que a vida surgiu há mais de 2 bilhões de anos.
Porém a grande revelação do livro dos patriarcas que os novos dono da verdade e cujo nome nunca deve ser pronunciado é que nunca houve uma primeira mulher e um primeiro homem e que nunca houve um limoeiro virgem e uma caipirinha pura. Que os homens e todos os seres que estão no planeta bola descendem da mesma primeira molécula que foi capaz de se auto replicar.
Sentada numa almofada na carroça que agora já não estava mais nas paradisíacas terras da praia de Copacabana e ia em direção sempre ao por do sol, Vanda escutava aquela história de verdades e mentiras, de povos que não habitavam mais a terra e sua antiga ancestral primeira célula replicante. Ela sentiu pena daquele primeiro ser, que na imensidão de um mundo vasto e solitário se dividiu em vários pedaços e cada vez mais pedaços que com o milhares de anos foram tomando outras formas, como se aquilo fosse magia das boas, como aquela praticada nos terreiros da antigas mães de santo. Porém, com uma voz cavernosa e cheia de autoridade de quem viu as bruxas serem queimadas nas fogueiras construídas pelos demônios de vermelhos, antes mesmo que esses se dividissem em dois povos do livro da nova verdade, o ancião que era a criatura mais velha na carroça dos ciganos, contava a história a história a Vanda e dizia que ela viera a terra não para trazer a concórdia, porque, tudo que ela ouvira ali deveria ser espalhado pelo mundo e por isso ela tivera como filho aquelas estranhas criaturas, que encheriam a terra de pergaminhos e colocaria a dúvida na cabeça dos sábios e causaria grandes discussões entre os pequenos. O ancião olhava dentro dos olhos de Vanda e apontava com o seu dedo longo e fino adornado de anéis feitos pelos antigos humanos que habitaram as savanas africanas antes que o homem ousasse colocar seus pés no chão.
___ Tu és forte minha filha, fostes a escolhida entre todas para dar a luz a este sete seres, mas saiba que eles não te pertencem, logo eles deverão ganhar o mundo, mas não penses que isso trará a paz. Eu lhe digo com todos os meus anos e viagens pelos sertões da vida que haverá contenda e guerra, mas vocês resistirão, ainda que muitos digam que vocês são aberrações, ainda que digam que vocês devem ser banidos. Porém, vocês estarão em todos os lugares e a assim como as antigas estrelas que embora emitam luz mesmo não estando mais lá, vocês também serão lembrados muito depois que tudo o que for deixar de ser e o que não é for desnudado como o véu da noiva virgem, que depois da primeira noite nunca mais é a mesma mulher.
Após essas palavras Vanda caiu em um profundo sono, mas antes de dormir ela espiou o céu estrelado lá fora enquanto a carroça atravessava os arcos da Lapa e teve a impressão que alguém observava da lua a carroça que agora se dirigia a algum lugar da noite carioca.

CAP 4
O SONHO DE VANDA
Em algum lugar de uma terra devastada por guerras que talvez já durassem um sec. Feita por homens que tentavam dominar aquela área apenas para vender produtos que também eram vendidos nas farmácias com outros nomes e dentro de embalagens elegantes. Vanda viu um prédio inteiro que subia muito acima de onde a sua visão podia ver. Ela teve um estremecimento ao notar que estava ali sozinha, que já não havia mais carroças e ela não estava com seus filhos. No princípio ela teve vontade de gritar, mas ela sabia que seus gritos não seriam ouvidos, assim como não foram os gritos das milhares de almas que por ali perambulavam e que gritaram em vida, mas agora apenas andavam por ali perguntando aos vivos que não os podiam ouvir onde eram as suas casas, onde estavam seus filhos, onde estavam seus maridos, suas esposas, seus parceiros e parceiros na antiga vida. Perguntas essas que os vivos não podiam ouvir e se ouvissem não responderiam, porque, todos estavam preocupados com as balas perdidas que procuravam achar alguém vivo para levar para a grande viagem.
Vanda sentiu-se penalizada pelos clamores daquelas vozes, mas nem mesmo ela que não desse mundo podia ajudar a dar aquelas respostas, então ela continuou o seu caminho até o prédio que parecia ser a única coisa que ali conseguia resistir a interminável batalha.
Ela entrou no prédio e não havia ninguém na recepção, porém, o elevador estava com as portas abertas e dentro dele um recepcionista que mais parecia um príncipe de contos medievais chamou-a até o elevador. Ela enfeitiçada por aqueles lindos olhos azuis e pele de uma cor café e o corpo de quem passara muito tempo carregando nos ombros o peso do mundo, mas, que naquele caso o deixara tão belo quanto uma estátua grega, andou até a porta do elevador, onde, aquelas delicadas mãos que um dia fora cheia de calos e marcas segurou-a e puxou para dentro do recinto, que era estranho, com as paredes de couro, o teto rosa e o chão vermelho.
Antes que Vanda tomasse a iniciativa de perguntar quem era aquele ser que ali naquele pequeno espaço a levaria até o topo do prédio a belo Delfim abriu a boca e de lá com um som que encantaria até a mais fervorosa torcida de um Jogo FLAXFLU anunciou.
____Não me reconheces? Eu sou o amor que não pode ser nomeado. Não tenho nome, mas durantes toda a existência de uma raça eu fui nomeado de várias formas. Eu não sou homem, embora me vejas como um, mas não sou mulher embora pareça ser um homem. Eu sou apenas uma forma de amar, e fui escondido aqui por inúmeras eras. Lá fora no mundo do qual viestes muitos amam seus semelhantes e a cada vez que um amor é escondido, a cada vez que um amante por medo e covardia prefere seguir outro caminho eu aqui fico mais belo. Eu sou o amor desperdiçado, eu sou o amor proibido, eu sou amor dos covardes, eu sou o amor dos valentes que morreram por amar, eu sou o amor dos que nunca dirão eu te amo. Eu sou o amor dos que ousaram amar os seus iguais e foram mortos por isso. A minha sina é aqui ficar até que homem seja livre para amar.____Dizendo isso ele se calou e não pronunciou mais uma palavra naquela subida que nunca parecia ter fim.
Quando chegaram ao fim do percurso Vanda saiu do elevador e viu-se diante de um grande corredor, onde pelo chão confetes, serpentinas e fantasias de carnavais passados se espalhavam por todo corredor. E lá no fim do corredor em uma porta de veludo negro e murais de mármore pendia aberta com uma tênue luz escapando pelas fretas e lá de dentro um suave música que Vanda podia reconhecer de alguma vida passada ou de um tempo perdido no esquecimento chegava até os seus ouvidos e ela sabia que era até lá que deveria se dirigir.


2 comentários:

  1. Gente adorei a história! Espero ansioso a continuação!

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  2. carlos eduardo- sou de cabo frio e pesso a integra da historia aqui no blog...abraços a todos do blog...

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