19.3.12

Búzios antigo: A visita dos ciganos e de quando o fundador de Búzios descobriu o Imã.


Primeiro trouxeram o ímã. Um cigano corpulento, de barba rude e mãos de pardal*, que se apresentou com o nome de Melquíades, fez uma truculenta demonstração pública daquilo que ele mesmo chamava de a oitava maravilha dos sábios alquimistas da Macedônia. Foi de casa em casa da aldeia de Búzios arrastando dois lingotes metálicos, e todo o mundo se espantou ao ver que os caldeirões, os tachos, as tenazes e os fogareiros caíam do lugar, e as madeiras estalavam com o desespero dos pregos e dos parafusos tentando se desencravar, e até os objetos perdidos há muito tempo apareciam onde mais tinham sido procurados, e se arrastavam em debandada turbulenta atrás dos ferros mágicos de Melquíades. "As coisas têm vida própria", apregoava o cigano com áspero sotaque, "tudo é questão de despertar a sua alma." José Ninguém, cuja desatada imaginação ia sempre mais longe que o engenho da natureza, e até mesmo além do milagre e da magia, pensou que era possível se servir daquela invenção inútil para desentranhar o ouro da terra. ( Trecho adaptado de 100 anos de solidão, Gabriel Garcia Marquez )

16.3.12

O maconhal da Búzios antiga. (Me contaram)




Um nativo já caminhando para a casa dos 60 me contou – pediu para não ser identificado -  sobre uma historia do fim da década de 60, quando começou a chegar uns cabeludos na aldeia.  Em uma ruela de lama – onde hoje seria a travessa do restaurante David-  havia antigo arbusto  - já parecia uma pequena arvore-  com a qual as mulheres faziam garrafadas para a cura de vários males como dor nas pernas, cicatrização de feridas e as vezes – me disse que era bem raro-  bebiam o chá para acalmar.  Os cabeludos colhiam muito as folhas desse arbusto, ninguém achava estranho. Um dia apareceu policia vinda da capital – talvez tenha vindo apenas de Cabo Frio – e cortaram o tal arbusto, que era um pé de maconha.


A aldeia de Búzios ( A fundação )

Praia do Canto, 1960, Búzios Antigo, Acervo Museu Brigite Bardot,
José Niguém  ( fundador do Búzios )  ignorava por completo a geografia da região. Sabia que para o Oriente estava a serra impenetrável, e do outro lado da serra a antiga cidade de Riohacha, onde em épocas passadas - segundo lhe havia contado o primeiro José Niguém, seu avô - Sir Francis Drake era dado ao esporte de caçar jacarés a tiros de canhão. Os bichos eram depois remendados, recheados de palha e mandados para a Rainha. Na sua juventude, ele e seus homens, com mulheres e crianças e animais e toda espécie de utensílios domésticos, atravessaram a serra procurando uma saída para o mar, e ao fim de vinte e seis meses desistiram da empresa e fundaram Búzios, para não ter que empreender o caminho de volta. Era, pois, uma rota que não lhe interessava, porque só podia conduzi-lo ao passado. Ao Sul estavam os charcos cobertos de uma eterna nata vegetal, e o vasto universo do grande pantanal, que, segundo testemunho dos ciganos, carecia de limites. O grande pantanal se confundia ao Ocidente com uma extensão aquática sem horizontes, onde havia cetáceos de pele delicada, cabeça e torso de mulher, que perdiam os navegantes com o feitiço das suas tetas descomunais. Os ciganos navegavam seis meses por essa rota antes de alcançar a faixa de terra firme por onde passavam as mulas do correio. De acordo com os cálculos de José Ninguém, a única possibilidade de contato com a civilização era a rota do Norte. De modo que dotou de foices, facões e armas de caça os mesmos homens que o acompanharam na fundação de Búzios; pôs numa mochila os seus instrumentos de orientação e os seus mapas, e empreendeu a temerária aventura.

Texto adaptado do classico 100 anos de solidão de Gabriel Garcia M